Em uma decisão recente, proferida no final de 2024 (Caso Netshoes – Acórdão número 3201-012.196), o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais reconheceu a possibilidade de o contribuinte se beneficiar de créditos de PIS/COFINS sobre gastos com propaganda e publicidade, considerando-os como insumos da atividade empresarial.
O assunto não é novo e tem sido debatido nos últimos anos, particularmente no que diz respeito às despesas com propaganda e publicidade, que estão inseridas em cada tipo de atividade empresarial. O centro de toda a controvérsia é o conceito jurídico de insumos para fins de crédito de PIS/COFINS.
Em 2018, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça analisou, através do sistema de recursos repetitivos, a definição de insumos para a concessão de crédito de PIS/COFINS, conforme estabelecido no artigo 3o, inciso II, das Leis n.o 10.637/2002 e 10.833/2003.
De acordo com o entendimento firmado pelo tribunal superior, o conceito de insumos deve ser aferido caso a caso, à luz dos critérios de essencialidade e relevância, considerando-se a imprescindibilidade ou importância de determinado bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade de cada contribuinte.
É de se observar que a conclusão emanada pelo STJ ainda possui um caráter subjetivo, com obrigatoriedade de análise do caso concreto. Com a finalidade de tornar os critérios para aferição do conceito de insumos um pouco mais objetivos, a Receita Federal editou o Parecer Normativo COSIT/RFB n.º 05/2018, norteando os auditores e contribuintes sobre o alcance do julgado do julgado do STJ.
No Caso Netshoes analisado pelo CARF, a atividade do contribuinte consubstancia-se em uma plataforma digital de intermediação e venda de mercadorias. O acórdão ponderou que o contribuinte possui atividade 100% digital, sem nenhuma loja física, de modo que toda e qualquer comunicação com seus clientes acontece exclusivamente por campanhas de publicidade, propaganda e marketing. Assim, chegou-se à conclusão de que tais gastos são fundamentais para a operação da empresa, elegíveis para gerar o direito de crédito de PIS/COFINS sobre insumos, nos termos do parecer emitido pela própria Receita Federal.
O voto ressaltou que “existe apenas uma única forma de a Recorrente atrair novos clientes e gerar novas receitas: o investimento em publicidade, propaganda e marketing. A Recorrente não consegue chegar aos potenciais consumidores pela via tradicional (através de um estabelecimento em boa localização, por exemplo), sendo absolutamente necessária a divulgação da sua marca e das soluções integradas que oferece aos seus clientes.”
Muito embora o fundamento autorizador do crédito nesse caso tenha sido o fato de o contribuinte ser uma plataforma 100% digital, sem lojas físicas, é importante destacar que o CARF já se manifestou de forma contrária em situação análoga.
De fato, no Caso Netflix (acórdão n.º 3302-012.005) julgado em 2021, o CARF vedou o crédito sobre as despesas de propaganda e publicidade para contribuinte que atuava exclusivamente em plataforma digital, sem lojas físicas. Na ocasião, prevaleceu o entendimento de que os gastos com propaganda e publicidade eram de caráter operacional, representando uma opção do contribuinte para aprimorar o desempenho da empresa, impulsionar as vendas e produzir mais lucros.
De acordo com o entendimento esposado em referido julgado, “somente os contribuintes que prestam serviços relacionados à área de marketing e publicidade, inclusive o desenvolvimento de marcas e de mercado, utilizando serviços de marketing prestados por terceiros como insumo essencial à sua própria prestação de serviços, poderão apurar e creditar-se do crédito de PIS/COFINS no regime da não cumulatividade.”
Em outro caso de serviços não presenciais julgado em 2019, Caso Visa (Acordão n.º 3201-005.668), prevaleceu o entendimento que a atividade do contribuinte precisa ser vinculada à publicidade e propaganda para tais despesas gerarem o direito de crédito: “É certo, nesse aspecto, que a Visa não é uma agência de marketing ou publicidade. Contudo, o “produto” que ela entrega aos seus clientes – repita-se, emissores e credenciadores, e não os usuários finais – é justamente a capacidade de ampliar suas vendas, sua inserção no mercado não apenas local, mas global, mundial, cujo instrumento é o marketing.” Dessa forma, as despesas com marketing e publicidade estariam intrinsecamente ligadas às receitas do contribuinte, ensejando o direito de crédito a título de insumos.
Além das manifestações do CARF sobre o tema, a Receita Federal do Brasil editou a Solução de Consulta COSIT n.º 60/2024 vedando o crédito de PIS/COFINS sobre despesas de propaganda e publicidade para empresas cuja atividade ocorra por meio de plataforma digital. Referido entendimento é vinculante e obriga os auditores a adotarem esse posicionamento.
Levando em conta as avaliações individuais do CARF e as diretrizes da Receita Federal, os contribuintes devem examinar, durante suas atividades, a importância dos gastos e despesas ligados à publicidade, propaganda e marketing, bem como sua conexão direta com a produção de mercadorias e a prestação de serviços.
Somente essa análise individualizada e robusta documentação comprobatória, demonstrando essa relação intrínseca dos gastos com a atividade do contribuinte, pode fortalecer o direito de crédito de PIS/COFINS sobre despesas com publicidade, propaganda e marketing, a título de insumos.
Alberto Gouveia Dantas é advogado tributário sócio do escritório Gouveia Dantas Sociedade de Advogados.
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